Raptus - O Diabólico Dr. Hichcock / O Horrível Segredo do Dr. Hichcock (L'orribile Segreto del Dr. Hichcock, Itália, 1962) – Riccardo Freda

★★★★★

Antes uma historinha:

Foi durante o período fascista de Benito Mussolini (1922-1945), que o cinema italiano foi proibido de fazer filmes de horror. Apenas anos depois, em 1957, que produtores resolveram se aventurar em fazer um, no caso I Vampiri, o filme começou a ser rodado por um diretor chamado Riccardo Freda, um tipo temperamental e explosivo que ao ver que não conseguiria terminar a obra no prazo de doze dias, no décimo dia acabou abandonando a produção, para terminar foi chamado um ajudante de direção, na verdade um faz tudo por trás das câmeras, que reescreveu o roteiro e finalizou o filme nos dois dias restantes, o nome do novato era Mario Bava, que até então não tinha dirigido um longa para chamar de seu (isso ocorrerá três anos depois com o icônico La Maschera del Demonio).

E enquanto Bava ia consolidando sua carreira como o Mestre do horror italiano, Freda continuava com sua prolífica carreira, passeando por praticamente todo tipo de subgênero italiano: peplum, spaghetti western, giallo, eurospy, etc. Porém, o fato é que, a despeito de sua importância histórica, I Vampiri é um filme irregular. Então corria por anos uma anedota: de que as partes boas do filme foram dirigidas por Bava e as chatas por Freda. E assim o experiente Freda foi obscurecido pelo seu substituto Bava.

Agora vamos a outro fato; Freda fez muitos filmes legais, e uma prova de que era sim um cara talentoso está neste O Horrível Segredo do Dr. Hichcock. Clássico absoluto do cinema gótico italiano.

O filme já chama atenção pelo título, mostrando que a sombra de Alfred Hitchcock sobrevoava os cineastas italianos – embora o personagem-título aqui lhe falte a letra ‘t’ no meio do nome. Outra referência foi o primeiro giallo de Mario Bava (a.k.a. o primeiro de todos os gialli) Olhos Diabólicos, cujo título original é La Ragazza che Sapeva Troppo, ou seja, A Garota Que Sabia Demais, uma referência óbvia ao O Homem Que Sabia Demais do Mestre do suspense.

Aqui estamos na Londres de 1885 e o protagonista é um médico necrófilo chamado Bernard Hichcock (Robert Flemyng, que só tinha lido um rascunho do roteiro e quando soube da tara do personagem quis cair fora, mas daí já era tarde demais), ele desenvolveu um potente anestésico que aplica todas as noites na sua bela esposa Margaretha (Maria Teresa Vianello), para que está fique adormecida, para o deleite do esposo. Até que um dia, o médico se passa na dose e mata a esposa. Ele entra em desespero (ué? Não gostava de mortas?). Pede demissão da clínica em que trabalhava, deixa a casa para a governanta Marta (Harriet Medin) e parte para uma viagem, onde só retorna anos depois, com sua segunda esposa a tiracolo, Cinzia (a icônica Barbara Steele, que virou musa do horror italiano graças ao sucesso de La Maschera del Demonio).

Enquanto Hichcock retorna a clínica, e se fica se batendo para não pegar às mortas do local (imagino o impacto do tema na época em que o filme foi lançado). Cinzia se sente oprimida pela presença (fantasmagórica?) da primeira esposa do marido, opressão essa que é reforçada pela cara azeda da governanta (neste ponto o filme lembra o clássico Rebecca de... Hitchcock). Mas por mais visões e sensações que a jovem tenha... nada a prepara para o clímax final que lembra algo do I Vampiri.

Com roteiro do lendário Ernesto Gastaldi, O Horrível Segredo do Dr. Hichcock mistura vários elementos de horror, e a aparente bagunça total, quase uma tarantela do carcamano doido, é salva pela direção firme de Freda. Com uma fotografia belíssima, valorizada pelos cenários, o filme é o puro suco do cinema gótico, com todos os elementos presentes: figuras fantasmagóricas, tempestades, névoas, gatos pretos, cripta, mansão sinistra, desejos reprimidos... uma bela aula de como criar atmosfera, e mostra definitivamente a relevância de Riccardo Freda.

Lindo demais!



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