A Semana do Assassino (La Semana del Asesino / Cannibal Man, Espanha, 1972) - Eloy de la Iglesia

★★★★

Eloy de la Iglesia (1944-2006) foi um prolífico e controverso diretor de cinema espanhol, pouco conhecido fora de seu país natal. Homossexual e filiado ao Partido Comunista espanhol, Eloy começou fazendo seu cinema com a censura franquista no seu cangote. Com o fim da ditadura espanhola, começou a ousar mais, se notabilizando pelos chamados ‘filmes quinqui’, um subgênero do cinema espanhol que retratava a delinquência juvenil, mostrando jovens periféricos e uso de drogas, foi nesta fase que o diretor adquiriu o vício em heroína. Seu cinema acabou influenciando outros diretores espanhóis, como o seu xará de sobrenome, Álex de la Iglesia, com quem não tem nenhum parentesco, e Pedro Almodóvar.

A Semana do Assassino, realizado ainda nos tempos sombrios da ditadura de franco, é seu trabalho mais conhecido por aqui - lançado recentemente em DVD no Brasil pela Versátil Home Video no box Obras-Primas do Terror: Horror Espanhol.

De início somos apresentados a Marcos (Vicente Parra), um pobre diabo fodido que mora em um barraco em meio a um descampado. Ele divide o casebre com o irmão caminhoneiro, e que está sempre na estrada. Trabalha em um frigorífico, o mesmo onde sua mãe morreu em um acidente laboral. E, por fim, namora Paula (Emma Cohen), uma jovem patricinha que esconde os romances dos pais na mesma medida que cobra maiores ambições de seu companheiro.

O filme segue uma narrativa linear, marcando os dias da semana.

Numa noite de domingo, Marcos e Paula estão trocando amassos no banco traseiro de um táxi. O taxista irritado expulsa os pombinhos do carro, agride Marcos e parte a encher Paula de tapas na cara. No afã de proteger a amada, nosso protagonista bate na cabeça do motorista com uma pedra, e o casal foge.

No dia seguinte, isto é, na segunda-feira. Os dois descobrem, pelos jornais, que o taxista morreu. Marcos, apavorado, resolve não falar nada para a polícia, já Paula pensa diferente. Neste momento a diferença de classe social pesa, pois segundo Marcos “a polícia não ouve o pobre”. Nada disso demova a moça da ideia de ir a delegacia, e no desespero Marcos acaba matando a namorada e escondendo no quarto.

Na terça-feira o irmão de Marcos retorna de viagem, e ao confessar os crimes, este também quer que o criminoso se entregue. Nosso protagonista não vê outra solução senão matar o irmão, e assim, como num efeito dominó, onde uma coisa puxa a outra, ele começa uma série de assassinatos.

Marcos vai escondendo os cadáveres no quarto, mas com o calor intenso do verão, o fedor vai ficando insuportável – é impagável ver quando Marcos depois de um dia de trabalho, chega em casa e encontra uma matilha de cachorros na porta, atraído pelo odor de podridão dos mortos.

Nesse ínterim, entre um crime e outro, Marcos é promovido na fábrica a trabalhar numa máquina enorme, que processa carne, transformando numas pastas para prováveis hamburgueres e salsichas, é aí que ele começa a levar numa bolsa parte dos mortos e desovar dentro da máquina.

Entra em cena também Néstor (Eusebio Poncela, que entre outros filmes, fez Matador de Almodóvar e 800 Balas de Álex de la Iglesia), um jovem homossexual rico e intelectual, que observa obsessivamente Marcos da janela de seu apartamento com binóculos, e que entra em contato com o assassino.

Com elementos de clássicos como Repulsa ao Sexo e Janela Indiscreta, este A Semana do Assassino é um fascinante e perturbador estudo sobre a degradação mental de um homem, a solidão e a sociopatia, tudo sobre o prisma da luta de classes.

Lançado no mercado internacional com o título apelativo e errôneo de Cannibal Man, já que o protagonista mesmo não pratica canibalismo, apenas tritura a carne de suas vítimas com carne de animais para outros comerem. De qualquer forma, embora não seja extremamente violento, com apenas algumas cenas de assassinatos gráficos e uma sequência repulsiva em um matadouro, mostrando bois sendo abatidos, na mesma linha do clássico curta-metragem Le Sang des Bêtes (1949) de Georges Franju, foi o título inglês que garantiu seu lugar na famigerada lista de Videos Nasties, para quem ainda não sabe, foi uma espécie de Index Librorum Prohibitorum do VHS na Inglaterra da Margareth Thatcher.

Feito visivelmente com poucos recursos, sem cair no terror convencional ou no melodrama, Eloy de la Iglesia constrói seu thriller psicológico e social de forma engenhosa, e ainda faz com que simpatizamos com o protagonista Marcos, por mais cagadas que ele faça.

Curiosamente Eloy detestava o final, uma conclusão que julgava moralista e estúpida, mas que foi uma imposição da censura franquista. De qualquer forma, ainda guarda uma ironia final.

Um filme que merece ser mais visto por um diretor que merece ser mais conhecido.



 

 

 

 

 

 

 

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